Uso de álcool na condução, excesso de velocidade e invasão da área de banhistas são algumas das infrações
O acidente marítimo que provocou duas mortes em Boipeba, dias antes da virada do ano, chamou atenção para os riscos aos quais estão expostos os passageiros de embarcações de passeio, banhistas e praticantes de esportes marítimos. Consumo de álcool na condução, excesso de velocidade, desatenção aos equipamentos de segurança e desrespeito aos limites de aproximação da costa são alguns dos aspectos em discussão.
Entre as possibilidades levantadas, e ainda não confirmadas, em relação ao ocorrido em Boipeba, o condutor da lancha causadora do acidente estaria embriagado, o que constitui infração ao Regulamento de Segurança do Tráfego Aquaviário em Águas sob Jurisdição Nacional. A legislação prevê suspensão de 120 dias da habilitação, com cancelamento em caso de reincidência, como penalidade ao ato de “conduzir embarcação em estado de embriaguez ou após uso de substância entorpecente ou tóxica”.
A regra aquaviária parece mais flexível do que a adotada para condutores de veículos terrestres, pois o Código de Trânsito Brasileiro classifica “dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência” como infração gravíssima. Uma vez que o bafômetro identifique álcool no sangue do motorista de um carro, por exemplo, a infração está caracterizada e implica em suspensão do direito de dirigir por 12 meses.
A diferença na severidade das leis contribui para que pessoas festejando no mar muitas vezes queiram incluir o condutor na navegação. A psicóloga Ilana Marques, 41 anos, presenciou essa situação quando contratou um passeio de escuna para comemorar seu aniversário. Teve convidado chegando no condutor e seu ajudante para oferecer uma cervejinha, enquanto ela e outras pessoas apontaram que ele estava “dirigindo”.
O condutor havia recusado a oferta antes mesmo que alguém se manifestasse, recorda Ilana, e tomou uma cerveja apenas no retorno, quando estava prestes a atracar. O capitão dos Portos da Bahia, Capitão de Mar e Guerra Wellington Lemos Gagno, informou que testes de alcoolemia fazem parte das ações de fiscalização e são aplicados “especialmente quando o condutor da embarcação apresenta sinais característicos de embriaguez”, em caso de recusa, haverá a suspensão da habilitação por 30 dias e aplicação de multa.
Segundo a Capitania dos Portos da Bahia, 18.920 embarcações foram abordadas ao longo de 2023, com a emissão de 907 notificações, realização de 997 testes de alcoolemia e apreensão de 153 embarcações. O detalhamento das ocorrências não foi informado, mas a CPBA elencou a ausência de habilitação dos condutores, problemas na documentação da embarcação, desrespeito do limite de lotação da embarcação e consumo de bebida alcoólica entre as infrações que mais chamaram atenção.
Proprietário da autoescola Nina Náutica, o instrutor Renato Queiroz diz que as normas aplicáveis ao tráfego marítimo são ensinadas em todos os cursos de habilitação oferecidos, de motonauta a capitão-amador, passando por arrais e mestre. “No nosso treinamento informamos para os futuros condutores que o consumo da bebida alcoólica é proibido”, ressalta. Para aprender a guiar embarcações é preciso ser maior de 18 anos e estar em boas condições físicas e mentais.
Segurança
Outras violações ao regulamento ressaltadas pelo comandante da Capitania foram: más condições de navegabilidade das embarcações, descumprimento da distância de 200 metros dos banhistas, a navegação em velocidade incompatível com a área de navegação e a falta de material de salvatagem (coletes, boias e extintores de incêndio).
Embora nunca tenha se deparado com ausência de coletes salva-vidas, Ilana conta que, como contratante ou convidada, nunca recebeu qualquer instrução de segurança durante os passeios. “Nós normalmente buscamos essas informações, chega ‘ah, tem aqui salva-vidas, como usa, como é que faz?’. Mas só isso, nunca tive orientações mais aprofundadas ou orientações básicas, talvez”, comenta.
Presidente da Associação Náutica da Bahia, Santiago Campo explica que a quantidade de coletes vai depender do tamanho da embarcação, mas a norma exige que o número corresponda a pelo menos 100% da capacidade máxima, acrescido de 10% desse total para uso em crianças. “Agora no Verão a busca pelo lazer é muito maior e o turismo também cresce muito”, reforça, destacando os limites de velocidade como outro ponto de atenção.
Com a prisão em flagrante convertida em preventiva, o condutor Aldir do Rosário, condutor da lancha que colidiu com outra embarcação em Boipeba, também estaria com excesso de velocidade. De acordo com a Capitania, “toda embarcação deverá navegar permanentemente a uma velocidade segura, de forma a lhe possibilitar a ação apropriada e eficaz para evitar colisão, bem como para ser parada a uma distância apropriada às circunstâncias e condições predominantes”.
Por conta dessa movimentação aumentada em todo o Verão, a Capitania segue até o final de fevereiro com a Operação Verão, marcada pela intensificação das ações de fiscalização. Considerando a adesão crescente ao uso de embarcações para voltar da Lavagem do Bonfim, a próxima quinta-feira deve ter um tráfego intenso naquele trecho da Baía de Todos-os-Santos. Em caso de emergência, a Capitania deve ser acionada pelo telefone 185.
Embarcações não podem se aproximar de banhistas
A temperatura agradável somada à quase ausência de ondas faz do Porto da Barra uma praia convidativa para pessoas de todas as idades tomarem um banho de mar. Assim como em vários outros pontos da orla, a tranquilidade frequentemente é quebrada por usuários de motos aquáticas, e até mesmo pequenas embarcações, invadindo a área que deveria ser exclusiva para os banhistas.
A circulação de embarcações de qualquer tipo em espaços reservados para pessoas é infração tipificada no Regulamento de Segurança do Tráfego Aquaviário em Águas sob Jurisdição Nacional, com previsão de multa e suspensão da habilitação por até 60 dias. De acordo com a Capitania dos Portos da Bahia (CPBA), a distância mínima entre os veículos aquaviários e os banhistas é de 200 metros.
“Tem gente que passa no meio dos banhistas. Da Barra a São Tomé, eles passam com jet, não todos, mas existe uma fatia sem nenhuma responsabilidade. Eu tenho vídeos e fotografias de coisas escandalosas, de barcos enormes passando ‘por cima’ do povo”, denuncia o presidente do Observatório da Baía de Todos-os-Santos, Moyses Cafezeiro. Em sua opinião, a CPBA se empenha na fiscalização, mas diante do tamanho da Baía considera inviável ter contingente suficiente.
Por isso, Cafezeiro vê a adoção de fiscalização eletrônica com aplicação de multas como solução para que condutores passem a ter mais respeito pelo espaço dos banhistas. No mapeamento feito pelo Observatório, ele identificou os seguintes pontos para instalação de câmeras: Ponta do Humaitá, Praia do Meio na Boa Viagem, Cantagalo, Porto da Barra, São Tomé de Paripe, Tubarão e Praia das Neves na Ilha de Maré.
Frequentadora da Praia do Meio, a vendedora Mariana Silva, 25 anos, diz nunca ter tomado nenhum susto dentro da água, mas já ter notado embarcações que pareciam próximas demais dela e outros banhistas. Ela acha que as câmeras podem ajudar a diminuir o problema, mas só se os infratores realmente foram multados, pois as pessoas “só respeitam quando sentem no bolso”.
Quando um banhista ou passageiro identificar irregularidades, a orientação da CPBA é que realize uma denúncia, “informando, se possível, o nome da embarcação e seu número de inscrição (ambos visíveis no casco), bem como o dia, a hora e o local”. Os canais para esse atendimento são o telefone (71) 3507-3777 e o e-mail da Ouvidoria – cpba.ouvidoria@marinha.mil.br.